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Aflitos bem-aventurados

No cotidiano de nossas vidas, não raro, ouvimos perguntas questionando a presença dos espíritos guardiães. Queixam-se os amigos por dores e angústias por que passam e, como quem responsabiliza ao outro, interrogam de modo aflitivo a razão de tantos tropeços pelo caminho. Onde estão os amigos desencarnados que dizem nos proteger? Como não nos preveniram sobre as turbulências tão desoladoras que a humanidade ora percorre?

É fácil encontrar, entre os homens neste mundo, aqueles que, mesmo sofrendo as injunções da vida, não se posicionam como filhos de Deus. São companheiros que articulam problemas e desafios como vingança ou castigo divino, que veem no outro, que não esposa as mesmas opiniões, o adversário a ser eliminado. E, nessa linha das emoções, enveredam pelo sofrimento através das trilhas da inconformação e da indisciplina, que ao se prolongando ganha a força devastadora do desespero. E o desespero atua como uma modalidade de alucinação, forjando, no seio da alma que o abriga, o imenso leque de dificuldades.

Antes de exigirmos alguma corrigenda de alguém, examinemos a própria aflição, para que essa não se converta em tempestade de inquietude destruidora.

Examinando-nos com firmeza, poderemos catalogar algumas das muitas emoções doentias que nos assolam. A aflição da agressividade que resulta em cólera, da inveja mãe do despeito, da indisciplina causadora da desordem, do fanatismo que patrocina a intolerância. Sentimentos comuns, mas que gravemente nos afastam dos ensinos do Cristo, ao provocarem situações estéreis, que unicamente têm como objetivo fazerem prevalecer os pontos de vista de si próprios; como aqueles que assumem decisões de larga importância e, sem ouvirem aos que lhe compartilham das responsabilidades, abraçam atitudes que comprometem a reencarnação.

No Sermão do Monte, Jesus proclamou: “Bem-aventurados os aflitos…”. Mas não estava o Mestre de Nazaré a cultuar os inquietos e apressados na rebeldia. Bem-aventurados os que choram, desde que não venham a transformar suas lágrimas em veneno da revolta ou descaso. Bem-aventurados os sedentos de justiça, desde que não transformem a própria justiça em instrumento do egoísmo pessoal.

Os ensinos de Jesus não se destinam exclusivamente ao momento vivido e passageiro. Jesus, o Mestre Maior, ergue o nosso olhar para a vida eterna, muito além das limitações religiosas formalistas, o Cristo eleva-nos com suas palavras e exemplos para as infindas possibilidades, tendo por única condição a vontade própria.

É exatamente por isso que nem todos os aflitos conseguem ser bem-aventurados ou todos os mansos, herdar a Terra. Porque somente ao entender que, aproveitando o momento de aflição e dor, para o aprimoramento íntimo e eterno, ao mesmo tempo em que se é chamado para a vida comum, nas lutas de cada dia, seremos capazes de semear e vivenciar a paz na Terra como homens de boa vontade.

Por Iriê Salomão de Campos, Comunidade Espírita “A Casa do Caminho” – ‘Tribuna Livre’ Publicado no espaço quinzenal cedido pelo Jornal Tribuna de Minas, 24 de abril de 2020, Juiz de Fora, MG.

6 de outubro de 2020 por: A Casa do Caminho